Mt 6:5-6. E, quando orares, não sejas como os hipócritas; pois se comprazem em orar em pé nas sinagogas, e às esquinas das ruas, para serem vistos pelos homens. Em verdade vos digo que já receberam o seu galardão. Mas tu, quando orares, entra no teu aposento e, fechando a tua porta, ora a teu Pai que está em secreto; e teu Pai, que vê em secreto, te recompensará publicamente.
Nosso Senhor continua a advertência contra uma religião exibicionista (Mt 6:1-4), cujo objetivo seja impressionar as pessoas ao nosso redor para colher elogios, admiração e quaisquer outras vantagens. “Quando nos tornamos muito falantes na oração, certamente estamos falando para nós mesmos” (A. W. Tozer) [2]. De fato, os fariseus que faziam todas as obras a fim de serem vistos pelos homens (Mt 23:5), gostavam também de fazer longas orações em público, hipocrisia reprovada pelo nosso Senhor (Lc 20:47). Mas o único elogio que o cristão verdadeiro deseja é o elogio de Deus, e por ele pode esperar o momento futuro, quando finalmente se encontrar com Ele: “bem está, servo bom e fiel” (Mt 25:21).
Certamente a reprovação aqui é específica contra o exibicionismo na oração pública, jamais contra o ato de orar publicamente, que é prática e ordem do Novo Testamento (Jo 11:41,42; At 4:24; 1Tm 2:8).
No tocante à oração, se ela é sincera, será feita para Deus e não como uma performance diante dos homens. Por isso nenhuma outra pessoa precisa ouví-la, além de Deus, que sempre ouve. Então a orientação para fazê-la em secreto, sem estar à vista de ninguém. Com isso cultivamos a honestidade e verdade da oração, quando ela realmente é uma relação entre nossa alma e Deus, e não uma atuação para os outros.
“A oração secreta é necessária para se abrir o coração a Deus, e para buscar aquilo que realmente é relevante para nossa pessoa” [1], é o momento propício para extravasar os sentimentos para com Deus sobre os assuntos que não são convenientes falar com qualquer outra pessoa (Sl 4:3,4). E convém que esta abertura do coração a Deus na oração secreta cotidiana seja realmente completa, não retendo nenhuma angústia, dúvida, preocupação, pecado, plano, desejo, sentimento do nosso Senhor, entregando-os para serem tratados e direcionados pelo Seu Espírito Santo. Não estejais inquietos por coisa alguma; antes as vossas petições sejam em tudo conhecidas diante de Deus pela oração e súplica, com ação de graças. E a paz de Deus, que excede todo o entendimento, guardará os vossos corações e os vossos pensamentos em Cristo Jesus (Fp 4:6,7).
Mt 6:7-9. E, orando, não useis de vãs repetições, como os gentios, que pensam que por muito falarem serão ouvidos. Não vos assemelheis, pois, a eles; porque vosso Pai sabe o que vos é necessário, antes de vós lho pedirdes. Portanto, vós orareis assim.
A verdadeira oração não consiste na repetição vazia e automática de frases e nem tem maior chance de atendimento se a pessoa falar a mesma frase muitas vezes. Ela deve ser uma expressão de fé e confiança em Deus, que já sabe as nossas necessidades.
Ele apresentará o modelo de oração, mas não para ser repetido como uma reza automática decorada. Em todos os registros do Novo Testamento das orações dos cristãos, não vemos essa oração sendo recitada nenhuma vez, bem como somos exortados a orar por outros assuntos aqui não especificados (Tg 1:5), portanto ela deve ser entendida como um roteiro de temas a serem tratados na oração, não de mero conjunto de frases a serem recitadas.
Mt 6:9. Pai nosso, que estás nos céus.
Meu Senhor me incentiva a chamar Deus de Pai, para que com a confiança de uma criança, consagre minha vida cotidianamente a Seus braços paternais, cujo amor e cuidado sempre superará os dos pais terrenos, que, mesmo sendo maus, fazem o bem a seus filhos, quanto mais esse Bendito Pai que me ama eternamente, sempre me fará somente o bem (Mt 7:9-11).
Mas eu tenho que lembrar que o Pai não é só meu, o Pai é nosso, e não vivo essa fé sozinho, mas com a grande multidão redimida, onde os filhos de Deus estimulam uns aos outros (Hb 10:24) a usufruírem e servirem nosso Pai.
Sou também lembrado que Ele está nos céus, ou seja, que Ele é o transcendente e onipotente soberano, que eu ainda estou na terra (Ec 5:2,3), ainda sou pó e cinza (Gn 18:27) e não devo deixar meus privilégios de filho decairem para um tipo de intimidade irreverente e desrespeitosa.
Mt 6:9. Santificado seja o Teu Nome.
Nosso Deus é digno de toda a glória, mas este mundo caído não lhe dá todo o reconhecimento, respeito, obediência e serviço devidos. Incluímos portanto na oração este desejo que cresça a santificação do Nome de Deus, isto é, o reconhecimento de todas as obras e atributos por meio dos quais Deus faz Suas criaturas conhecerem a Sua glória, em especial para que a palavra do Senhor tenha livre curso e seja glorificada (2Ts 3:1), uma vez que esta é o instrumento comum para a conversão dos homens a Deus.
Mt 6:10. Venha o teu Reino.
Conforme o nome de Deus for sendo santificado, o Seu Reino no tocante à submissão das Suas criaturas a Ele há de crescer na mesma proporção (Is 9:7), até o dia em que Ele traga o juízo final e crie o Novo Céu e a Nova Terra, que será o Seu Reino na plenitude, sem mais qualquer parte em rebeldia contra Sua justiça. O cristão deve em suas orações lembrar dessa expectativa, amando e anelando pela Volta de Cristo, que há de realizá-la (2Tm 4:8).
Mt 6:10. Seja feita a Tua vontade, assim na terra como no céu.
A terra é, especialmente, o lugar caído do universo, onde há grande inconformidade das criaturas contra a vontade de Deus. Não é assim no Céu, onde os anjos obedecem a Deus e o servem com toda a fidelidade (Hb 1:14). O anelo deste modelo de oração é que os homens se tornem cada vez mais como os anjos em pura obediência e serviço. De fato, um dia os salvos o serão (Mt 22:30), mas hoje ainda pedimos que Deus nos capacite a caminhar nessa direção.
Mt 6:11. O pão nosso de cada dia nos dá hoje.
Ele nos ensina a não atribuir a nós mesmos a obtenção do pão diário, mas à uma concessão da providência e cuidado de Deus a serem pedidos e reconhecidos na oração.
No deserto Deus deu a Israel o maná pela manhã de cada dia, mas não dava mais que o necessário, e não podiam guardar para o dia seguinte, no dia seguinte eles deviam sair novamente para colher (Ex 16:15-21). Assim Ele demonstrou Sua vontade contra o nosso acúmulo de bens materiais, da qual falará a seguir no sermão (Mt 6:19). Assim, devemos orar por todas nossas necessidades materiais, mas com a simplicidade de pedir a cada dia, o necessário para aquele dia, afim de que, no dia seguinte, reconheçamos a Deus novamente como nosso perpétuo provedor, e renovemos nossa confiança e dependência diariamente, que O glorificam como o Sustentador que Ele é de todos.
Mt 6:12. Perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós perdoamos aos nossos devedores.
Lembrando de novo que o Pai é “nosso” e não somente “meu”, assim o perdão, a graça e a misericórdia do Pai são também para o nosso próximo, mesmo quando o próximo nos faz algum mal. Deus nos ordena corresponder à graça do perdão dos nossos pecados recebidos, retribuindo-a no nosso próximo, perdoando-lhe também, sempre (Mt 18:21-35).
Mt 6:13. Não nos conduzas à tentação, mas livra-nos do mal.
Como disse depois o Senhor: o espírito está pronto, mas a carne é fraca. Por isso oramos, reconhecendo que precisamos desesperadamente que Deus nos indique a saída das tentações, a qual Ele prometeu sempre dar, pois sem a força e sustento do Seu Espírito Santo, fatalmente cairemos nas armadilhas do mundo, da carne e do Diabo, desonrando nosso amado Pai com novos pecados. Aquele, pois, que cuida estar em pé, olhe que não caia. Não veio sobre vós tentação, senão humana; mas fiel é Deus, que não vos deixará tentar acima do que podeis, antes com a tentação dará também o escape, para que a possais suportar (1Co 10:12,13).
Mt 6:13. Porque Teu é o reino, e o poder, e a glória, para sempre, amém.
O roteiro de oração termina com adoração pura que declara os atributos, dignidades e prerrogativas de Deus, para reforçar nossa confiança na plena capacidade e autoridade de Deus para nos atender muito mais abundantemente além daquilo que pedimos ou pensamos, segundo o poder que em nós opera, e ao nosso Pai celeste seja dada glória na igreja, por Jesus Cristo, em todas as gerações, para todo o sempre. Amém! (Ef 3:20,21). [3]
Mt 6:14-15. Porque, se perdoardes aos homens as suas ofensas, também vosso Pai celestial vos perdoará a vós; Se, porém, não perdoardes aos homens as suas ofensas, também vosso Pai vos não perdoará as vossas ofensas.
Novamente o Senhor Jesus nos reforça o Seu chamado para que aqueles que receberam a Graça do perdão dos pecados por meio dEle, a distribuam aos outros como testemunho vivo da mesma. Mais do que o seguimento de regras morais, é a distribuição desse perdão abundante vindo de Deus para o nosso próximo que seria mais corretamente descrito como o “viver o Evangelho” que dá o poderoso testemunho de Cristo que o mundo precisa ver, e da luz do mundo e sal da terra que devem ser os que professam o Seu Nome (Lc 16:5-7). Portanto, quando estiverdes orando, perdoai, se tendes alguma coisa contra alguém, para que vosso Pai, que está nos céus, vos perdoe as vossas ofensas (Mc 11:25).
[1] O que é oração? LOPES, M. Texto eletrônico em <https://edificacaocrista.blogspot.com/2022/07/o-que-e-oracao-vida-crista-13.html> (06/07/2025).
[2] Pérolas para a vida. BLANCHARD, John. <https://bit.ly/PÉROLAS> (06/09/2025).
[3] Grande parte destes comentários sobre a oração do Pai Nosso se inspiraram no Catecismo Maior de Wesminster, perguntas 183 a 196 [<https://drive.google.com/file/d/18P_NF0-Dqa4v0OQfLVPF-hs3ILzq7Tm3/view?usp=drive_link> (06/09/2025)] e no Catecismo Ortodoxo de Herculles Colins, perguntas de 135 a 149 [<https://drive.google.com/file/d/1fXfb-APv8RijGTW6MUjscJuhQkJNa9Wk/view?usp=drive_link> (06/09/2025)].